Desafios da educação a distância on-line

A educação a distância (EAD) não é mais novidade em nosso cotidiano, faz tempo que ela está inserida na história da educação desde o surgimento da imprensa, que possibilitou a existência dos livros e, portanto, da comunicação de informações além das fronteiras do tempo e espaço. Isso possibilitou à humanidade disseminar conhecimentos que antes eram restritos a vida de quem os elaborava partir de pesquisas e hipóteses. A história do conhecimento e das transformações dos recursos naturais em novas benfeitorias para o trabalho e vida humanas ganharam outra dimensão quando a escrita nos permitiu o registro e disseminação de descobertas feitas por gerações anteriores de pesquisadores, cientistas e pensadores.

Mais recentemente, principalmente nos séculos XIX e XX o desenvolvimento de novas modalidades de transmissão do conhecimento sistematizado visando a formação profissional e acadêmica utilizando a comunicação remota ganharam seu protagonismo. Desde o surgimento de instruções em periódicos como revistas para atividades como culinária, corte e costura e serviços técnicos até a formação escolar através de materiais entregues via correios o ensino remoto, em que os aprendentes estavam a centenas de quilômetros dos professores, o ensino a distância foi se tornando capaz de superar a barreira da escassez de infraestrutura educacional e assegurando que pessoas pudessem buscar a consolidação de novas habilidades e competências técnicas e acadêmicas.

Estas práticas de aprendizados remotos foram ganhando mais força à medida que novas tecnologias de comunicação foram se somando aos meios escritos, como o rádio, discos de vinil e fitas cassete com aulas gravadas, televisão, videocassete, DVD e, finalmente, a Internet. Esta última está sendo a grande catalisadora de uma revolução na forma como superamos as distâncias geográficas e garantimos o acesso a educação para populações afastadas dos grandes centros urbanos e até de outras nacionalidades, como aconteciam com as aulas de Língua Inglesa e Francesa pelas rádios BBC de Londres e Rádio França Internacional (RFI), respectivamente.

Em muitos países o ensino superior utilizando os meios de comunicação se tornaram possíveis desde a segunda metade do século XX, com várias iniciativas daquilo que foi nomeado como universidades abertas (UAs), inaugurando assim um novo tempo para a educação e com um formato compatível com a disseminação do ensino e inclusão de pessoas nos cursos acadêmicos.

A educação a distância passa a ter uma importância social ímpar nos processos de inclusão na oferta de formação para um contingente de pessoas que, por ausência de centros de ensino nas adjacências ou com incompatibilidade de horários com as rotinas de trabalho dos estudantes, estavam excluídos do acesso a formação superior (Senter e Raymundo, 2018). Neste ponto inaugura-se um novo paradigma para tornar o ensino superior democraticamente acessível a camadas mais populares da população, principalmente num país de fortes contrastes étnicos, sociais e econômicos como o Brasil.

O objetivo deste trabalho passa a ser analisar como a EAD pode superar as desigualdades históricas e promover políticas de inserção da população brasileira no ensino superior como forma de minimizar todo um histórico de segregação das populações nativas, negras e pobres ao ensino superior mesmo enfrentando várias dificuldades como a exclusão digital e dimensões continentais do país.

Considerando que temos uma área territorial continental e que, historicamente, os centros de ensino foram predominantes inseridos nas capitais dos estados ou regiões mais desenvolvidas economicamente (Senter e Raymundo, 2018), o Brasil condenou sua população interiorana a exclusão do acesso ao ensino superior por décadas, acentuando as já existentes desigualdades educacionais e econômicas das populações mais pobres. Somente nas primeiras décadas do século XXI, com a chegada à Presidência da República de partidos mais ligados aos movimentos populares, é que começamos a experimentar de fato uma nova realidade em políticas públicas voltadas para a interiorização das instituições de ensino superior e, também, alterações nas normatizações que permitiram a instituições privadas pudessem oferecer cursos superiores na modalidade EAD contribuindo para maior acesso a este nível de educação, compatíveis com a classe trabalhadora nos quesitos de horários e custos financeiros acessíveis.

Passamos a presenciar o surgimento do sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), como um programa articulado entre o governo federal e Estados, apoiando as instituições públicas de ensino superior para disponibilizar cursos de nível superior e de pós-graduação por meio das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) na modalidade EAD em regiões interioranas e distantes dos centros urbanos do país. Entretanto, cabe também ressaltar que ainda existem dificuldades com esta forma de inclusão educacional quando nos deparamos com os cenários de pouca penetração das estruturas de conectividade à Internet principalmente nas comunidades do Norte do país. Outra situação ainda incomoda é o desenvolvimento acanhado de inovações no uso de ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) pelas instituições de ensino superior, como aponta Alonso e Silva (2013), evidenciando a necessidade de incentivos à construção de novas propostas de educação mediada pelas tecnologias que assegurem a qualidade e alcance dos desafios propostos neste modelo de educação.

É essencial que as propostas de inclusão proporcionadas pela EAD tragam consigo também a preocupação com a formação cidadã dos estudantes, contribuindo para o desenvolvimento social de suas comunidades e regiões. Este é um desafio que se põe dentro da ótica de educação proposta por Paulo Freire em que o aprender também se firma como ato de reinvenção do mundo para uma sociedade com mais dignidade e justiça, como nos diz Ribas (2010). Este olhar para uma educação mais comprometida com a luta em favor da democratização do ensino e dos bens públicos sempre foi uma fala recorrente no educador pernambucano e sua preocupação também era a de situar as tecnologias como manifestações políticas a serviço das classes populares.

Daí a necessidade de construção de propostas pedagógicas que tragam consigo práticas educativas onde o diálogo com a classe trabalhadora não se restrinja somente a constituição de uma narrativa neutra ou voltada aos interesses mercadológicos, mas também de oferecer o desenvolvimento de concepções autônomas de construções do conhecimento, mas também de reconhecimento do saber do educando e sua relação com uma pedagogia crítica e conscientizadora. A educação que insere o indivíduo nos meios produtivos não pode deixar de ser, também, uma prática de reflexões sobre os mecanismos de alienação do trabalhador e manutenção de desigualdades, injustiças e exclusões sociais.

Segundo Ribas (2010), a educação como processo responsável pela manutenção e perpetuação, ao transpor para as novas gerações, as maneiras culturais de ser, estar e agir está contribuindo para a convivência e sincronia do cidadão no seu grupo ou sociedade. Isto confere às práticas educativas um papel inclusivo e includente dos indivíduos que deve abarcar também uma dialética conscientizadora e emancipadora destes sujeitos no processo de reconstrução social. A educação, tanto presencial quanto aquelas mediadas pelas TICs, não pode se tornar bancária ou reprodutora de concepções alienadoras. Assim, o papel das instituições de ensino superior não pode separar nos desenhos dos ambientes virtuais de aprendizagens (AVA) e das propostas curriculares o caráter pedagógico e social da educação.

Se uma das vantagens do modelo de educação a distância é justamente a construção de uma postura autônoma do educando no processo de aprendizagens, também não pode ser retirada desta autonomia a sua compreensão como agente de transformação da sociedade. Neste momento a importância de uma educação dialética assume o protagonismo, pois confere sentidos aos saberes propostos pelo projeto de educação com sua vivência e com as expectativas sociais e políticas dos estudantes. Uma ação com essa proposta é possível quando a práxis educativa acontece tendo o diálogo e as interações como edificadores da autonomia, da participação e de uma consciência dos sujeitos dentro desse processo.

Um ponto em que todas os pressupostos que norteiam as propostas pedagógicas da educação a distância mediada pelas tecnologias é o sentido que damos a ação educativa. Assim, as discussões da educação que se insere não somente na dimensão acadêmica, mas que contribui também para ressignificação de nossas dimensões sociais e política acabam trazendo mais significado a construção de uma educação de qualidade, capaz de instrumentalizar o educando com as competências necessárias à sua formação para uma consciência cidadã, questionadora, crítica, emancipatória e transformadora. Na medida que as propostas e desenhos da EAD contiverem estas finalidades mais compromisso os educandos terão com suas aprendizagens, resultando em melhores resultados nas práticas educativas para alcance dos objetivos e finalidades que os motivaram a aderir ao ensino online.